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Cuidados dentários na Esclerodermia

Cuidando dos dentes

A esclerodermia está freqüentemente associada com alguns potenciais problemas de saúde, destacando:
Xerostomia – hipofunção das glândulas salivares ("boca seca");
Microstomia – diminuição da amplitude da abertura da boca;
Aumento da freqüência de cáries e doença periodontal;
Alterações fibróticas;
Infecções fúngicas (gênero Candida);
Telangiectasias;
Reabsorção óssea da mandíbula.
Os principais e mais comuns dentre estes problemas são a xerostomia e a microstomia. É a presença destas alterações que contribuirá de maneira importante para que as demais alterações possam ocorrer.

Xerostomia
As pessoas com xerostomia estão mais suscetíveis à doença periodontal, às cáries e às infecções bacterianas, devido à perda das funções protetoras da saliva. A boca seca também pode contribuir para dificuldades na fala, na alimentação e na deglutição.
Cuidados com a higiene bucal e freqüentes consultas ao dentista são importantes para tentar minimizar estes problemas.

Estratégias potenciais

1. Aumento da salivação
1.1 Estimulantes da saliva
1.2 Pastilhas ou goma de mascar sem açúcar
1.3 Saliva artificial
1.4 Enxaguar a boca com club-soda
2. Diminuir o número de bactérias nos dentes através de uma escovação adequada.
3. Alterar o potencial de cariogênese da dieta, evitando alimentos que contenham açúcar e que sejam muito pegajosos.
4. Aumentar a resistência dos dentes à desmineralização com o uso de flúor.
5. Pessoas com xerostomia deveriam tomar aproximadamente oito copos de água por dia. Carregar uma garrafa de água é uma boa idéia. O aumento da ingestão de água às refeições auxilia no sentido de facilitar a mastigação e a deglutição.
Diferentes graus de xerostomia existem. Os sintomas podem variar da boca seca ou sensação de queimação com mucosas normais até graves alterações na mucosa bucal. Clinicamente, a mucosa pode ficar seca, atrófica (brilhante), inflamada, pálida e translúcida. A língua pode ter um aspecto ressecado, atrófico com perda das papilas, inflamado, cheio de fissuras ou sulcos e, nos casos graves, lisa (devido à remoção da camada externa).

Alimentos e outras substâncias a serem evitados

Os seguintes alimentos e substâncias podem ter um efeito irritativo na mucosa oral ressecada:
Secos
Á cidos
Á lcool
Cigarro
Condimentados
Os seguintes alimentos são melhor tolerados:
Gelatinas
Batatas
Iogurte
Melão
Balas ou gomas de mascar sem açúcar

Como se alimentar

Mastigar todo o alimento lentamente.
Aumentar a ingestão de líquidos para auxiliar na mastigação, deglutição e na limpeza dos resíduos de alimento.
Os dentes e a boca devem ser limpos após cada refeição, preferencialmente por uma escovação completa.

Dentaduras

Potenciais problemas podem incluir:
Dificuldades de retenção devido à boca seca;
Maior suscetibilidade à ulceração oral devido à boca seca e ao movimento das dentaduras;
Maior suscetibilidade às infecções fúngicas;
Estomatite angular com manchas ou ulcerações avermelhadas nos cantos da boca.
Procedimentos que podem auxiliar ou aliviar os problemas com as dentaduras são:
Consultas periódicas ao dentista para manutenção das dentaduras e eliminação de problemas potenciais;
Saliva artificial, que ao lubrificar a mucosa oral e a garganta, contribui para a retenção da dentadura;
Limpeza meticulosa dos dentes;
Manter as dentaduras úmidas quando fora da boca;
Remover as dentaduras ao deitar-se;
Tratamento imediato de ulcerações e infecções fúngicas.

Microstomia ("boca pequena")

Quando as bochechas perdem sua elasticidade e os tecidos da face se tornam endurecidos, a pele pode se ligar ao tecido conectivo subjacente. Este processo é acompanhado por uma gradual redução do tamanho da boca, de modo que a mastigação e a fala se tornam dificultadas.
Além das dificuldades na mastigação (etapa importante na preparação dos alimentos para a digestão), a restrição aos movimentos da língua e o aparecimento da microstomia freqüentemente levam a um sério comprometimento da capacidade do paciente em realizar sua higiene oral rotineira. Este esforço também pode ser dificultado pela diminuição da flexibilidade das mãos devido às contraturas articulares da doença.

Técnicas e dispositivos de higiene especiais para a microstomia

Escovas de dentes suaves;
Freqüente e suave escovação dos dentes;
Técnicas especiais de escovação dos dentes;
Escovas de dentes anguladas;
Escovas de dentes fáceis de manusear;
Escovas de dentes especialmente adaptadas, com longos cabos;
Dispositivos especiais para a limpeza entre os dentes;
Instruções específicas de dentistas ou especialistas em higiene (escovação, flúor, etc.).
É importante tentar preservar os próprios dentes, já que as dentaduras são muito problemáticas para pessoas com esclerodermia. Cuidados preventivos em casa e no consultório do dentista são extremamente importantes. Tente encontrar dentistas familiarizados com a esclerodermia e seus problemas associados. Ou, talvez, recomende esta leitura para o seu dentista, para auxiliá-lo(la) a compreender melhor os cuidados especiais com um paciente esclerodérmico.
Panfleto da Scleroderma Foundation, elaborado com o auxílio do Dr. Jeffrey Corbett (Columbia University School of Dentistry and Oral Surgery, Nova Iorque – EUA); tradução do Dr. Percival D. Sampaio-Barros (UNICAMP).

Um pouco mais sobre Esclerodermia (Infantil)

ESCLERODERMIA
O que é?
Esclerodermia é uma palavra grega que pode ser traduzida por “pele endurecida”. A pele torna-se brilhante e dura. Há várias doenças que têm como característica principal o endurecimento da pele. Há dois tipos de Esclerodermia: a esclerodermia localizada e a sistêmica.
Na esclerodermia localizada a doença está limitada à pele e aos tecidos que estão debaixo da pele afetada. Pode ter a aparência de manchas (morphea ou morféia) ou de faixas finas (esclerodermia linear).
Na esclerodermia sistêmica (ou esclerose sistêmica) o processo é mais abrangente e envolve não só a pele mas também os órgãos internos do corpo. Pode causar sintomas diferentes como por exemplo azia, dificuldades respiratórias e pressão arterial elevada.

É uma doença comum?
A esclerodermia é uma doença rara. As estimativas apontam para uma ocorrência anual de 3 casos em cada 100.000 pessoas. A esclerodermia localizada é a forma mais comum nas crianças e afeta predominantemente meninas. Apenas 10%, ou até menos, dos casos de esclerodermia em crianças são do tipo sistêmico.

Quais são as causas desta doença?
A esclerodermia é uma doença inflamatória, mas a causa da inflamação ainda não foi descoberta. A esclerodermia é, provavelmente, uma doença auto-imune, o que significa que o sistema imunitário da criança reage contra ele mesmo. A inflamação causa inchaço, calor e a produção de tecido fibroso.

É hereditária?
Não é hereditária, embora haja alguns casos de ocorrência em membros da mesma família.

Pode ser prevenida?
Não se conhece prevenção para esta doença.

É contagiosa?
Não é contagiosa. Algumas infecções podem desencadear a doença, mas a doença em si não é infecciosa e as crianças que dela sofrem não precisam de ser isoladas.

A) Esclerodermia localizada
1) Como é que a Esclerodermia localizada pode ser diagnosticada?
A aparência de pele endurecida é um indicador. Nas fases iniciais, é frequente aparecer em volta da mancha um círculo avermelhado, que indica inflamação na pele. Nas fases posteriores da doença, nos indivíduos de pele clara, a pele torna-se castanha e depois branca., Nos de pele escura as manchas na pele tendem a ser escurecida.O diagnóstico é feito a partir da aparência típica da pele.A esclerodermia linear tem a aparência de uma faixa linear no braço ou na perna.O processo pode afetar o tecido sob a pele, incluindo o músculo e o osso. Às vezes, a esclerodermia linear pode afetar a face e o couro cabeludo. Os exames de sangue costumam ser normais. Na esclerodermia localizada é raro haver envolvimento significativo dos órgãos internos.

2) Qual é o tratamento para a esclerodermia localizada?
O tratamento tem como objetivo controlar, o mais cedo possível, a inflamação, e tem pouco efeito no tecido que já está fibroso. Quando a inflamação desaparece, o organismo é capaz de reabsorver algum do tecido fibroso e a pele pode voltar a ficar mais suave.
As opções de tratamento variam entre nenhuma medicação até ao uso de de esteróides e metotrexate. Não há estudos que mostrem, claramente, a eficácia de tratamentos para a esclerodermia localizada. Contudo, sempre que existam, estes tratamentos têm de ser supervisionados e receitados por um reumatologista pediátrico e/ou dermatologista pediátrico.
Normalmente, o processo resolve-se por si só, embora possa levar alguns anos e, apesar de tudo, pode haver recorrências.
Na esclerodermia linear pode ser necessário fazer um tratamento mais intenso.
Neste caso, a fisioterapia é importante. Quando a pele afetada está sobre uma articulação, é essencial manter a mobilização daquela articulação e, se for aconselhado, fazer a massagem profunda. Nos casos em que a perna é afetada, pode acontecer um comprimento desigual da mesma, levando à alteração da marcha com maior pressão nas costas, quadris e joelhos. Estes efeitos podem ser evitados colocando uma palmilha no sapato.
As massagens das lesões, com cremes hidratantes, evitam que a pele fique endurecida.
Cosméticos faciais podem ajudar a diminuir a aparência das marcas. Nos indivíduos de pele clara, a pele deverá ser protegida com filtro solar total para que a morféia (que não se bronzeia) não seja tão evidente.

B) Esclerodermia/esclerose sistêmica
1) Como é diagnosticada a esclerodermia sistêmica? Quais são os principais sintomas?
Os primeiros sinais são a mudança de cor dos dedos das mãos e dos pés, juntamente com alterações de temperatura de calor para frio (Fenômeno de Raynaud) e as úlceras nas pontas dos dedos. Tanto a pele da ponta dos dedos das mãos e dos pés, quanto a do nariz costumam endurecer e ficar brilhante. Isso pode também acontecer à pele de todo o corpo. No início da doença os dedos podem inchar e as articulações ficarem dolorosas.
Durante o curso da doença, os órgãos internos podem ser afetados e o prognóstico a longo prazo depende do tipo e da gravidade do envolvimento dos órgãos internos. É importante que se façam vários exames para se verificar se os órgãos internos estão afetados, apesar de não haver um exame específico de sangue para a esclerodermia.
Na maioria das crianças, na fase inicial da doença, o esôfago é afetado. Isto pode causar azia, que resulta do fato do suco gástrico refluir ao esôfago. Mais tarde, pode acontecer distensão abdominal e dificuldades de digestão. É frequente os pulmões serem afetados e esse é um determinante essencial do prognóstico a longo prazo. Também é importante para o prognóstico, o envolvimento de outros órgãos como o coração e os rins.

2) Qual é o tratamento para a Esclerodermia sistêmica nas crianças?
A decisão sobre qual o tratamento necessário tem de ser tomada por um reumatologista pediátrico com experiência nesta doença e deverá ser tomada em conjunto com outros especialistas como o cardiologista ou nefrologista. Corticosteróides são usados juntamente com metotrexate e penicilamina. Quando os pulmões ou rins estão afetados, é comum usar-se a ciclofosfamida. Nos casos do Fenômeno de Raynaud, para preservar a pele do máximo de danos possíveis, é aconselhável manter sempre o corpo aquecido e, quando necessário, tomar-se medicação para dilatar os vasos sanguíneos. Não há nenhum tratamento específico que tenha mostrado ser claramente eficaz no tratamento da esclerodermia sistêmica. Outras formas de tratamento estão, neste momento, sendo estudadas e há esperança que se descubra um tratamento mais eficaz nos próximos anos.
Durante a doença, para que as articulações e as paredes da caixa torácica conservem a mobilidade, é necessário que se faça fisioterapia e tratamento tópico para a pele dura.

Que acompanhamentos periódicos são necessários fazer?
Os “check-ups” periódicos são necessários para avaliar a evolução da doença e para alterar o tratamento. Porque os órgãos internos (pulmões, aparelho digestivo, rins, coração) podem ser afetados, é necessário manter o controle sobre o seu funcionamento, de forma que os problemas sejam detectados precocemente.
Quando se tomam determinados medicamentos, é necessário controlar periodicamente os seus efeitos secundários.

Quanto tempo se manterá a doença?
A evolução da esclerodermia sistêmica é, de um modo geral, limitada a alguns anos. Normalmente, o endurecimento da pele para após dois anos do início da doença. Por vezes, só para após 5 ou 6 anos, e algumas manchas podem tornar-se mais visíveis, mesmo depois do processo inflamatório ter terminado, devido às mudanças na cor da pele. Algumas vezes, a doença poderá parecer estar mais ativa devido ao crescimento desigual nas partes do corpo que estão afectadas e nas que não estão. A sistêmica é uma doença crônica que pode durar toda a vida.

Qual é a evolução a longo prazo da doença (prognóstico)?
Normalmente, a Morféia (manchas) deixa apenas marcas na pele. A esclerodermia linear pode deixar a criança com graves problemas devido à atrofia dos músculos e à diminuição do crescimento dos ossos, além de que pode provocar deformidades nas articulações.
A esclerose sistêmica é potencialmente uma doença grave. O grau de envolvimento dos órgãos internos (coração, rins e pulmões) varia de paciente para paciente, sendo o determinante principal da evolução a longo prazo. Em alguns doentes, a doença pode estabilizar por longos períodos de tempo.

É possível recuperar totalmente?
As crianças com esclerodermia localizada recuperam. Após algum tempo, até a pele endurecida pode recuperar o seu aspecto normal. A recuperação da esclerose sistêmica é menos provável, mas pode haver melhora considerável ou, pelo menos, a doença pode estabilizar.


Esclerodermia: Doença que enrijece a pele e afeta órgãos internos é pouco conhecida


Mário Barra Do G1, em São Paulo
 
Mãos manchadas de Rosângela
Castro  mostram uma das
características da esclerose sistêmica.
(Foto: Rosângela Castro/arquivo pessoal)

A esclerodermia, doença autoimune capaz de trazer sérias complicações à pele e a órgãos como esôfago e pulmões, ainda é desconhecida de grande parte dos profissionais de saúde no Brasil. Com diagnóstico difícil e, no máximo, 300 casos por milhão no mundo, portadores da doença no país reclamam da dificuldade para explicar e tratar a patologia, na qual o sistema de defesa do organismo ataca as próprias estruturas do corpo.

A doença ganhou destaque na imprensa em novembro por conta do caso de Susan Johnson, britânica de 61 anos com uma pele "similar" a de uma pessoa com 40, uma consequência do excesso de colágeno produzido pelo corpo. A substância é uma proteína capaz de revitalizar a pele, mas em doses excessivas causa espessamento e endurecimento, dificultando o movimento de mãos, boca e pálpebras.

"Há um estímulo para que os fibroblastos, células que produzem colágeno, façam uma megaprodução. O colágeno fica muito proliferado. As fibras ficam uma em cima da outra, se acumulam e vão deixando a pele dura", explica Percival Sampaio-Barros, médico reumatologista da Universidade de São Paulo (USP). O especialista é chefe do Ambulatório de Esclerodermia da universidade e presidente da Comissão de Esclerose Sistêmica da Sociedade Brasileira de Reumatologia.

Mas a pele só é a única afetada na versão menos agressiva da doença, a esclerodermia localizada. Nela, os órgãos internos não são acometidos. Existe também a esclerose sistêmica, na qual estruturas como esôfago, estômago, rins, coração e pulmões podem ter o seu funcionamento prejudicado, abrindo espaço para uma série de sintomas paralelos. Ambas não são contagiosas e não há indicações de que sejam hereditárias.
Rosângela Castro, 54 anos, convivendo com
a esclerose  sistêmica desde 1994.
(Foto: Rosângela Castro / arquivo pessoal)
Junto com a grande produção de colágeno, a doença é causada por alterações no sistema de circulação do corpo, com vasos mais constritos e com a atuação irregular dos linfócitos no corpo.
A causa para a esclerodermia não é conhecida, mas quando os médicos conseguem identificar a doença a tempo, é possível controlar os sintomas. Até dois terços dos pacientes conseguem levar vidas relativamente tranquilas, mantendo suas atividades e trabalhando.

A causa para a esclerodermia não é conhecida, mas quando os médicos conseguem identificar a doença a tempo, é possível controlar os sintomas. Até dois terços dos pacientes conseguem levar vidas relativamente tranquilas, mantendo suas atividades e trabalhando.

Foi o caso de Rosângela Castro, 54 anos, moradora de Petrópolis (RJ) até 2009. Comerciante, é portadora de esclerose sistêmica. Após passar pelo Sistema Único de Saúde (SUS) em 1994 por causa de uma falta de ar intensa, com febre e dores nas costas, ela foi atendida por uma médica que, durante uma conversa, notou manchas na pele da paciente.
"Estava brilhante, havia manchas vermelhas na face. E o contato com o frio deixava minhas mãos roxas", conta Rosângela. "A médica pediu um exame de autoanticorpos e a doença foi diagnosticada." Neste ano, com a piora das dores nas articulações e o avanço da doença, a comerciante se viu obrigada a ficar em casa.

  
"Até então, eu ia empurrando com a barriga. Tinha crises de hipertensão por causa da medicação para controlar a doença, dores nas articulações. Há gente que tem úlceras digitais, como consequência do fenômeno de Raynaud. Eu tenho a síndrome, mas nunca tive as dores", explica Rosângela.


O frio de Raynaud
Pacientes com esclerose sistêmica normalmente convivem com o fenômeno de Raynaud, constante nos casos de esclerose sistêmica e esclerodermia localizada. A síndrome causa a constrição de vasos sanguíneos a cada estímulo frio. Durante o inverno, os pacientes precisam redobrar a atenção para proteger as extremidades do corpo, que em alguns casos chegam a apresentar ulcerações. Pode ser preciso, em casos mais graves, recorrer a amputações. 

"O vaso sanguíneo em si não chega a entupir, mas sim o leito para passagem de sangue. É um fenômeno muito comum, pode ocorrer em 2% a 5% das mulheres jovens, mas só 1% desse grupo vai evoluir para uma doença autoimune como a esclerose sistêmica. Em homem também é raro", afirma Percival. "Mas é a manifestação mais dolorosa da esclerodermia, os pacientes reclamam bastante."  

Manchas no rosto similares a varizes nas pernas
também surgem nos pacientes, o que chega a
motivar preconceitos até mesmo por parte de
familiares, segundo relataram os portadores ao G1.

A família de Ana Veríssimo Florezi conhece bem os incômodos causados pela enfermidade. A filha da moradora de São João da Boa Vista (SP), Ana Paula, de 28 anos, sofre de esclerose sistêmica desde 1999. “Ao voltar do colégio, ela ficava muito cansada ao caminhar. Conforme o tempo foi passando, as mãos dela começaram a ficar roxas, com manchas”, conta a mãe.

“Ninguém descobriu o que era aqui na minha cidade, passei com minha filha por vários médicos. Uns falavam que era depressão, outros falavam que era coluna. Até que o único reumatologista que a gente tinha aqui afirmou que era lúpus [outra doença autoimune]”, conta Ana Veríssimo.
 
Cinco anos se passaram desde o diagnóstico errado. Ana Paula começou o tratamento correto só em 2004. A mãe coordena rigorosamente o cronograma de remédios a serem tomados. "Ela toma Imuran [imunossupressor], calcort [cortisona], tramal [analgésico], peridal [para o estômago], sildenafril [composto presente no Viagra, para circulação], trental [pentoxifilina]. Ela ainda usa lágrimas artificiais, aplicadas a cada duas horas, pois os olhos ficam secos", elenca Ana Veríssimo.

"Sempre comprei todos os remédios, contando com ajuda de meus amigos. Há um ano, entrei com um mandado de segurança para obter a medicação, é um direito que ela tem, mas na prática, até eu conseguir os remédios demora muito. Já chegamos a ficar dois meses sem receber a medicação. Durante esse tempo, como minha filha não pode ficar sem, deixei de pagar minhas contas para comprar o que ela precisava", lamenta a mãe.


Muito além da "dermia"
O órgão afetado com maior frequência na forma sistêmica da doença é o esôfago (90% dos casos). A estrutura liga a boca ao estômago, sendo responsável pelo transporte de comida. Para isso, conta com movimentos conhecidos como peristálticos. "Quem tem esclerodermia possui disfagia, que é uma dificuldade para engolir", diz Percival.
Os pulmões também são acometidos com regularidade (40% a 50% dos casos). "Há uma falta de ar progressiva, o paciente passa a ter o órgão endurecido - é a fibrose pulmonar. Além disso, existe o problema da hipertensão, causada pelo acometimento da artéria pulmonar. É necessária uma maior pressão para bombear o sangue nos pulmões", explica o médico. 

Complicações também podem surgir no estômago (lentidão na digestão), intestino (diarreias, prisões de ventre), rins (insuficiência renal aguda) e coração (insuficiência cardíaca, inflamação nas membranas que recobrem o órgão e arritmias), cada uma em menos de 15% dos casos.

Quanto ao rosto, é comum que os pacientes pareçam ter a pele esticada, com diminuição dos lábios e da boca e o afilamento do nariz. "Os pacientes relatam que estão com uma espécie de 'máscara' na cara, com a pele endurecida", diz Percival. Por fim, as mãos também sofrem com a rigidez do órgão, ficando em forma de garra, com movimento reduzido. 

Dermatologia com reumatologia
Na modalidade localizada, a esclerodermia se manifesta apenas na pele, deixando o órgão mais espesso. Essa é uma consequência da produção exagerada de colágeno. Apesar de aparecer em cremes de rejuvenescimento, no caso dos esclerodérmicos, a dose extra da substância não traz bem nenhum.

Os transtornos são confirmados por Fernanda Savarege, portadora de esclerodermia localizada há cinco anos. “Começou na minha coxa. O primeiro médico a que fui disse que era mancha de sol e passou um clareador à base de ácido”, explica. "Foi difícil no início, pois na internet há umas fotos horríveis. Pesquisei um pouco para tentar entender. É uma doença que varia muito de pessoa para pessoa. Quanto aos médicos também foi complicado, fui a cinco dermatologistas e a dois reumatologistas." 

Como muitos pacientes são normalmente encaminhados a dermatologistas, especialistas dessa área precisam trabalhar em parceria com reumatologistas para os casos mais severos. "Os dermatologistas, normalmente, fazem o diagnóstico e trabalham com as formas localizadas segmentares, mas é preciso trabalhar em conjunto para os pacientes que apresentam manifestações em todo o corpo", explica Aldo.
 

Divulgação e prevalência
A luta dos portadores da doença resultou na criação da Associação Brasileira de Pacientes com Esclerose Sistêmica (Abrapes), fundada por Percival para divulgação e para promover ações que melhorem a condição dos pacientes. Há também uma comunidade na rede social Orkut que conta com 700 membros. Nela há informações sobre sintomas e relatos.

Têm ocorrido, recentemente, iniciativas de esclarecimento sobre a doença, no Brasil e no exterior. O primeiro congresso mundial sobre esclerose sistêmica aconteceu em 2009 e foi realizado na cidade de Florença, na Itália. O próximo deverá ser realizado em 2012, em Madri, capital espanhola.

Sobre a falta de conhecimento, Percival Sampaio-Barros acredita que o preparo está mudando. "Há vinte anos, quando comecei, havia poucos profissionais na área. É um paciente difícil, que exige acompanhamento, o tratamento é específico para cada órgão, há um número pequeno de profissionais interessados", explica o médico. "No Brasil, a melhora no diagnóstico tem trazido resultados recentes, com os pacientes podendo ter os sintomas controlados antes."

Não há estudo sobre a prevalência da doença no Brasil. "É possível dizer que vem aumentando. No momento em que surgem novas modalidades terapêuticas, é importante que se diagnostique o paciente o mais rápido possível: exame de autoanticorpos ou pela capilaroscopia periungueal, para pacientes que ainda não tiveram a pele espessada", diz Percival.